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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Falsas Dicotomias Evangélicas

“Dicotomia” é um método de classificação que postula apenas duas opções de “escolha” para dado problema / questão.

Por exemplo, ou uma pessoa está viva, ou ela está morta. Não existe um ser semivivo, ou semimorto. Quando uma mãe está esperando um filho, ou será menino ou menina, não existe um 3º sexo distinto destes dois (apesar de que a criança pode nascer hermafrodita, mas são casos extremamente raros).

Os dois exemplos acima representam dicotomias, apenas duas hipóteses possíveis para dada questão.

“Falsas Dicotomias” são casos em que, para dada questão, postulam-se apenas duas opções (geralmente dois extremos), quando, na verdade existe uma ou mais opções que não foram consideradas.

Veja um exemplo: "Marcos está atrasado para o trabalho. Ou seu carro quebrou, ou dormiu demais. Ligamos para ele e não estava em casa, então seu carro deve ter quebrado."

No exemplo acima, uma dicotomia foi postulada para explicar a razão pela qual Marcos se atrasou para o trabalho. Porém, podemos observar claramente, que várias outras possíveis razões para o atraso de Marcos não foram consideradas: Marcos poderia estar agarrado no trânsito, ele poderia ter levado sua mãe para tomar uma injeção para gripe, ele pode ter sido seqüestrado, ele pode até estar morto. Enfim, existem inúmeras razões pelas quais Marcos possa ter se atrasado para o trabalho, mas, estabeleceu-se de forma equivocada uma dicotomia (ou seu carro quebrou ou ele dormiu demais).

A “Falsa Dicotomia” é uma non-sequitur, uma falácia lógica. Uma maneira equivocada de se obter a verdade sobre um problema qualquer. “Falsa Dicotomia” também é chamada de “Falso Dilema”, “Pensamento Preto e Branco”, ou “Falsa Bifurcação”.

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Várias falsas dicotomias são pregadas na Igreja Evangélica (sim, generalizei, se a igreja onde você freqüenta não faz uso de falsas dicotomias, dê glória a Deus, pois isso é muito raro), todo final de semana praticamente eu escuto falsas dicotomias na igreja onde eu freqüento.

“Ou você é de Deus, ou você é do Diabo”
“Ou o que você faz é obra de Deus, ou é obra de Satanás”
“Ou você anda no Espírito, ou está nas Trevas”
“Ou você da ‘boa noite’ para Deus, ou diz ‘boa noite’ para o Diabo”
“Ou a música louva a Deus, ou ela louva a Lúcifer”
“Ou você vive uma vida absolutamente sem pecado, ou você vai queimar no fogo do Inferno”

Tenho comentado com minha namorada: evangélicos adoram falar sobre coisas “tenebrosas”. Termos como “Diabo”, “Satanás”, “trevas”, “obra demoníaca”, “Inferno”, “Condenação” e “batalha espiritual” são muito mais mencionados nos cultos do que “Graça”, “Arrependimento”, “Perdão” e “Amor ao Próximo”. São tantos termos que Jesus relevou – ou, se mencionou, mencionou poucas vezes e em contextos específicos – e que a Igreja adora citar e mencionar. Não fico um final de semana sem ouvir os termos “inferno”, “Diabo” ou “trevas”. As menções sobre “batalha espiritual” – endossado pelo sensacionalismo barato de escritores com parafusos a menos como Benny Hinn e Rebecca Brown – me irritam muito também.

E aí são pregadas as falsas dicotomias. Certa vez, em uma reunião de Domingo na igreja em que freqüento, a pessoa que dava o estudo sobre “Gálatas 5” disse algo como “o que não é obra do Espírito é obra da Carne. Não existe meio termo. Ou você está fazendo algo de Deus, ou você está fazendo algo das trevas”.

Neste exato momento, perguntei para minha namorada em seu ouvido: “e mascar chicletes, é obra satânica?”.

Permita-me trabalhar melhor este conceito aqui. É óbvio que mascar chicletes não é “Obra do Espírito”. Os chicletes não foram criados por Deus para o louvor da Sua Glória. Ninguém masca chicletes com o intuito de “adorar a Deus” ou com o objetivo de “propagar a mensagem do Evangelho”. Mascamos chicletes simplesmente porque gostamos. É docinho; se for de menta ele deixa o hálito refrescante; se estivermos apreensivos ou preocupados, mascar um chiclete ajuda a relaxar; enfim, existem n móvitos pelos quais gostamos de mascar chicletes, mas nunca ouvi alguém fazer qualquer menção a Deus como causa pela qual está mascando chicletes.

Existem, portanto, ações, atitudes ou atos que não são “Obras do Espírito”, mas que também não devem ser consideradas “obras da carne”. São ações simplesmente naturais do ser humano. Como meu amigo Glauber disse em um de seus brilhantes textos:


O nosso evangélico afirma que tudo o que fazemos deve ser feito "para a honra e glória de Deus". Assim, ele segue seu raciocínio e nos ataca: "Você vai honrar e glorificar o nome do Senhor em um bar ou danceteria? Você está indo lá para pregar o evangelho? Essa música que você está ouvindo louva o nome de Deus? Olha, pode até não ser errado, irmão, mas devemos evitar."

Bem, realmente não vamos a uma festa para honrar e louvar o nome de Deus, e é verdade que muitas músicas que ouvimos também não o fazem. Na verdade, muitas músicas não falam absolutamente nada sobre Deus. Nem contra e nem a favor. Mas será que tudo o que fazemos deve ser para honrar e louvar o nome de Deus? Será que tudo mesmo?

Então eu faço as seguintes perguntas: Alguém faz sexo pensando em Deus? Alguém em pleno ato sexual levanta as mãos pro céu e faz uma oração? Ainda uma outra pergunta: Alguém vai ao banheiro pensando em Deus? Alguém chega "diante do trono" (desculpem o trocadilho inevitável) e ora: "Deus, esta obra é para o Seu louvor"?

Sim, fui um pouco extremista em meus exemplos. Mas isso foi intencional, pois o que eu quero deixar claro é o seguinte: nem tudo o que fazemos, o fazemos para Deus. Há muitas coisas que fazemos simplesmente porque somos deste mundo, sim senhor(a). É impossível e desnecessário suprimir a nossa humanidade, da qual o próprio Jesus se revestiu. (Fonte).



Ao escrever este presente texto, me veio à mente que o livro “Cânticos de Salomão” não tem objetivo algum de louvar a Deus, em nenhuma instância. O livro é uma carta de amor escrita por um homem à sua amada. Salomão usa até termos um tanto “calientes” ao se referir à sua amada, como referências às pernas e os seios dela. Apesar de a igreja interpretar os cânticos como uma alegoria ao fato de a Igreja ser a noiva de Cristo (interpretação que eu considero absolutamente equivocada), é impossível escapar do fato de que esta carta foi concebida por um homem com o objetivo de agradar à sua amada, não a Deus.

Perguntem a qualquer judeu – eles são uma autoridade muito maior para comentar sobre o Velho Testamento do que eu – e ele lhes dirá que os Cânticos de Salomão são poemas de amor, apenas.

O livro de Ester, também, não faz qualquer menção a Deus e todo o seu livro.

Até na Bíblia, portanto, nem tudo é feito para a glória de Deus.

Lembro que um professor de seminário, Marcos Cunha, hoje pastor da Igreja Batista do Tirol em Varginha, quando questionado sobre o “poder” ouvir músicas seculares, respondeu assim:

– Eu escuto sim. Adoro “14 bis”. Isso nunca atrapalhou minha fé. Imagina você indo para a lua de mel com sua esposa ouvindo “Castelo Forte é o nosso Deus...”?!

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Existem atos, ações e atitudes que não fazemos visando louvar a Deus, mas que também não são “obras de satanás”. Existem ações que são naturais, humanas, próprias a nós, seres humanos. Se existem tal classificação de ações – as ações naturais – esta dicotomia pregada pelos evangélicos é falsa.

Sabendo que as boa parte das dicotomias são falsas (existem algumas dicotomias verdadeiras), ouvi-las todo final de semana, irrita muito e enche o saco.

Você – líder, pastor ou pregador – evite pregar por dicotomias, ou pense muito bem antes de usá-las. A mente do seu rebanho agradece.


Eliel Vieira

2 comentários:

  1. Concordo com vc em algumas questões.
    Mais realmente o que não é obra do Espírito é obra da Carne.
    Afinal sexo é algo da carne e não do espirito.Por isso ninguem orar qndo esta praticando.
    E em relação as necessitades... fala serio!!!!?
    Foi patetico.
    Muitas fezes qndo eu estou fazendo alguma eu oro e até louvo.Acho que exemplos pessoas não devem ser levados em consideração. Se vc acha não faz, pq julgar.
    Acho que as pessoas deviam mais falar de Jesus do que querer dizer o que as pessoas "devem ou não fazer". Não apoio tal doutrina “Dicotomia” . Mais acho que so existe dois caminhos futuros: o céu ou inferno . Se tiver um meio termo por favor me diga ai eu saberei mais um ou dois sei lá vc que sabe

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  2. Sim, concordo com vc anônimo, que há coisas nesse texto (que não é meu, apenas repostei aqui) que faltam um certo embasamento. E sim, existem coisas no evangelho que são dicotômicas, como Céu e Inferno. Mas o sexo, que vc considera "obra da carne", foi criado por Deus para o homem e a mulher serem felizes e se reproduzirem, tal como os outros animais também. Orar antes fazer de fato é exagerado, mas também acredito que um casal precisa de ter bom senso sobre os limites de cada um, entre outros aspectos do sexo que ignoramos por vezes. A questão de práticas, digo que não estou e nem o autor do texto está julgando. É apenas opinião, e no dia em que dar sua opinião for julgar, estaremos todos perdidos.

    Mas muito boa sua crítica, espero que possas ler-nos mais vezes.

    Fique na paz!

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