Sites de notícias evangélicas e mídias sociais esta semana bombaram com comentários sobre a notícia de que a Justiça mandou retirar um outdoor erguido pelo pastor Antônio Hernandez Lopes, da igreja Casa de Oração, na cidade de Ribeirão Preto/SP com mensagens contra os homossexuais (veja imagem acima). O outdoor, colocado exatamente na semana da “7ª Parada do Orgulho LGBT”, foi considerado agressivo, discriminatório e de “conteúdo homofóbico” pelo defensor público Victor Hugo Abernaz Junior.
Dois sentimentos me sobrevieram subitamente logo que li a notícia. O primeiro, vergonha pela atitude imbecil do dito pastor que, longe de tencionar qualquer objetivo evangelístico, quis, na verdade, agredir os homossexuais usando a Bíblia (voltarei a este ponto depois). O segundo, um sentimento de justiça pela boa ação da justiça em imediatamente retirar o outdoor agressivo.
Como é típico em sua característica de se achar o povo mais perseguido do universo, os evangélicos esbravejaram contra tamanha injustiça do Estado. “Estão impedindo a liberdade de liberdade de expressão!”, “Como tamanha afronta pode acontecer em um Estado democrático?”, “A Bíblia é homofóbica?”, “Deus é homofóbico?” “O que será nós?” “Oh… e agora, quem poderá nos defender?”
A troca de ideias com alguns amigos evangélicos sobre a questão instigou em mim algumas dúvidas em, estas dúvidas, este texto.
As discordâncias deles para comigo se concentraram exatamente nos dois sentimentos que tive mencionados acima. Primeiro, eles discordaram que o pastor agiu de forma incorreta ao colocar este outdoor; discordaram que ele seria de caráter ofensivo ou preconceituoso. Segundo, eles discordaram que o Estado tinha o direito de retirar o outdoor.
Vamos interagir agora um pouco com minhas opiniões e as réplicas que eu ouvi.
Em minha opinião, o dito pastor foi completamente infeliz em criar, na semana de uma parada gay, um outdoor contendo trechos isolados que, lidos isoladamente, não transmitem a essência do Evangelho. Em minha opinião, a intenção do tal pastor não foi transmitir o Evangelho, mas agredir os homossexuais.
Ora, se o objetivo fosse transmitir a mensagem do Evangelho, por que não colocar um versículo evangelístico? Por que não colocar o famoso João 3:16? Ou, para não usar um versículo tão batido, por que não usar o seguinte, 3:17, “Porque Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele.”
Será que a melhor forma de transmitir a discordância sobre o consumo de álcool é colocando placas com mensagens infernais (isto é, mensagens que apontam quem lê para a realidade do “inferno”) na porta de cada bar? Será que a melhor forma de transmitir o Evangelho para prostitutas é colocando placas em portas de bordeis afirmando que elas estão praticando coisas abomináveis e que o fogo do inferno as espera? Será que a melhor forma de falar a uma pessoa contra a idolatria é chutando uma santa em rede nacional?
Nos evangelhos quem aborda o pecador com pedras nas mãos não é Jesus, mas os fariseus. Jesus é aquele que diz, “Eu também não te condeno… Siga tua via e não peques mais.” (João 8:1-11)
Quanto à passagem acima, os defensores do direito de poder apontar o dedo geralmente enfatizam demais o “não peques mais”, como se isso de alguma forma fosse um precedente em Jesus para que possamos, nós, apontar o dedo contra os pecadores e lembrarmos-nos do seu pecado.
Esta interpretação é completamente equivocada. Abaixo eu traduzo as palavras de Greg Boyd em seu excelente livro The Myth of a Christian Nation.
Nós precisamos ter em mente que uma coisa é uma pessoa sem pecados como Jesus dizer “vai e não peques mais”, e outra coisa completamente diferente é pessoas como nós – com grandes troncos saindo dos olhos – dizermos a mesma coisa. Mas, ainda mais crucialmente, precisamos ter em mente que o aspecto central da passagem é que nenhum dos acusadores da mulher estava em posição para julgá-la. (…) Entretanto, a única pessoa que poderia justificadamente tacar-lhe pedras se negou a fazê-lo.
Quem este pastorzinho boçal pensa que é para poder, usando a Bíblia de forma completamente desequilibrada, atacar aqueles que ele considera pecadores?
(Antes que alguém afirme que eu estou sendo incoerente em julgar a atitude do pastor afirmando que é errado julgar, o mesmo Jesus que é compassivo com os pecadores das ruas nos evangelhos é duramente implacável contra os pecados dos líderes e dos que detém o poder. Não devemos julgar os pecadores, mas devemos, sim, julgar os que detêm o poder e que, com ele, fazem uso indevido.)
Então vem a pergunta levantada por muitos. Mas o pastor não citou a Bíblia? Seria a Bíblia homofóbica? Deus é homofóbico?
É necessário sabedoria para manejar a Bíblia. No contexto em que estamos, com toda esta discussão que apenas separa cada vez mais os homossexuais do Evangelho, a escolha de um texto tão arcaico de Levítico (livro cujos mandamentos não são praticados por 100% dos evangélicos), foi infeliz. Pouco importa aqui se o homossexualismo é ou não pecado. Que seja; eu concordo que seja. Será que a forma de abordagem deve ser tão alheia à forma como Jesus abordou a mulher adultera de João 8?
Em que um pastor colocando um Outdoor desse exatamente em uma semana de parada gay (para provocar, instigar o ódio) diverge de um grupo homossexual praticando “beijaço” na porta de uma igreja? Nenhuma.
Outra questão é se o Estado tem ou o não o direito de retirar o outdoor. E aqui os evangélicos se acham hiper-espertos e enchem a boca para dizer que temos “direito de expressão”, “direito de livre manifestação do pensamento”.
Amiguinho… nós vivemos em um Estado organizado, com leis, e não em uma anarquia;não confunda as coisas. A própria liberdade precisa de limites para que ela não se perca (Chesterton). Existe “direito de expressão” e “livre manifestação do pensamento”? Sim, mas você não é livre para expressar seu pensamento de que os negros são uma raça inferior sem ter que responder judicialmente por isso. Existe “liberdade religiosa”? Sim. Mas o conteúdo de sua religião, seja discriminatório, preconceituoso ou gerador de violência será restringido. Edir Macedo alguns anos atrás teve seu livro “Orixás, Caboclos e Guias” proibido de ser circulado por conter conteúdo discriminatório contra religiões brasileiras afro-indígenas.
Se daqui dez anos tivermos uma controvérsia social das mesmas proporções que temos hoje em relação à homossexualidade com relação aos direitos das mulheres, um grupo que erguer um Outdoor com aquilo que eles consideram como “evidências bíblicas para a superioridade masculina” muito provavelmente verá seu Outdoor sendo derrubado pelas mesmas razões.
Para o Estado – com todo respeito aos meus irmãos evangélicos e a Bíblia à qual eu tenho tanta reverência – pouco importa o que a Bíblia diz. (Assim como pouco importa o que o Alcorão diz ou o que Alan Kardec diz.) O livro sagrado para o Estado deve se submeter é a Constituição Federal. A Bíblia dizer que a homossexualidade é pecado e o “Livro Sagrado Patati Patatá” dizer que engolir chicletes desagrada ao grande Babaloo, aos olhos de quem deve cumprir a Constituição, é a mesma coisa. Estamos (graças a Deus) em um Estado laico. Você tem opiniões religiosas? Ok. Quer compartilhá-las? Ok, fique à vontade. Desde que não perturbe a paz e a ordem, fique à vontade.
Termino esta exposição de minhas opiniões afirmando que, em minha opinião, assim como Jesus não compactou com os fariseus religiosos de sua época e sempre ficou do lado do pecador que ele veio salvar, hoje ele não apoiaria esse outdoor. Como seu discípulo eu também não apoio e parabenizo a Justiça pelo razoável ato de mandar tirar a mensagem.
De Eliel VieiraOpinião: Com certeza é um texto bastante reflexivo, e convenhamos, boa parte da militância LGBT e homossexuais em geral já devem estar carecas de saber desses versículos, e realmente, isso os afasta mais do evangelho do que aproxima.
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